O meu amigo Mamadou Ba, ativista antirracista, está a ser arguido num processo por difamação movido por Mário Machado, conhecido criminoso de extrema-direita e condenado por vários crimes, nomeadamente pela sua implicação no assassinato de Alcindo Monteiro.
Mamadou é acusado de difamação precisamente por ter referido a implicação de Mário Machado nesse assassinato.
Muitos são os que se indignam com esta subversão brutal de valores e apelam aos órgãos do Estado para exercer o seu poder no combate às forças do racismo e do fascismo que estão em ascensão.
Por minha parte, não tenho ilusões no Estado, não o vejo como algo acima das relações sociais, neutro e votado à persecução da defesa dos direitos fundamentais.
A história demonstra que o Estado exerce o seu poder de forma unilateral, defendendo uma minoria da sociedade, os seus valores e os seus privilégios.
Demonstra ainda que o Estado é tanto mais conivente com a opressão racista quanto mais isso sirva para defender o que lhe é fundamental: o direito à propriedade privada dos meios de produção em detrimento das condições de vida e de trabalho da esmagadora maioria da população.
Há muitos anos que participo na luta antirracista. Aquando da vaga de ataques racistas que culminaram com o assassinato de Alcindo, defendi, como continuo a defender, o direito dos oprimidos — neste caso, da juventude e dos trabalhadores negros —, a exercer a autodefesa, assim como a imperiosidade de as organizações dos trabalhadores, nomeadamente dos sindicatos, se envolverem na luta contra a violência racista e fascista.
Na altura, quem defendeu esta posição foi acusado pelos racistas e fascistas, tal como agora é acusado o companheiro Mamadou, de ser promotor de violência e de um “racismo” invertido.
Mas remeter para as Instituições estruturalmente racistas e permeáveis ao racismo e ao fascismo a defesa dos direitos democráticos é desarmar os explorados e oprimidos e colocar um obstáculo à tomada de consciência necessária para combater eficazmente a extrema-direita que sempre se levanta quando este sistema entra em crise.
A esquerda seguiu durante demasiado tempo uma política equivocada de “não provocar” e “não dar visibilidade aos racistas”, confiando às instituições, às forças de “segurança” e ao sistema judicial, o defesa dos oprimidos. Isto só fez com que crescessem no seio dessas “forças de segurança”, tal como de outras instituições do Estado, os partidários da violência racista e fascista.
Só a organização e ação comum dos explorados e oprimidos, com ações de massas democraticamente decididas e implementadas, pode travar os que, ao abrigo de uma suposta “liberdade de expressão”, espalham o ódio racista e a ideologia fascista, violentam e assassinam os oprimidos e os trabalhadores…
Francisco d’Oliveira Raposo
membro do Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa, membro do Comité Central da Esquerda Revolucionária