Herdámos séculos de criminalização de conveniência das pessoas negras e de séculos de dessensibilização em relação a corpos que são apresentados como mais fortes, com menos sensibilidade. Resultado: hoje, ainda, as pessoas negras são escrutinadas de uma forma doentia, porque manifestam, porque falam, porque escrevem, porque têm um penteado assim ou assado, porque não sorriem, porque não dançam, porque respiram. São perigosas. É necessário castigar e domesticar a(o)s bruta(o)s selvagens que ousam viver sem autorização.
“Já não se pode dizer nada”, mas a defesa da liberdade de expressão afinal não é para todos.
Tomam-se as dores do opressor, coitadinho. E a sua honra e reputação?
O oprimido é forte, ele aguenta, nasceu para aquilo e pôs-se a jeito.
Decide-se quem tem direito a errar, a transgredir, e quem nem a boca pode abrir por vezes para dizer a evidência.
A equiparação do antirracismo ao racismo, do mauzão ativista Mamadou Ba ao coitadinho neonazi multi-condenado Mário Machado é também fruto destes processos de desumanização e subalternidade.
Diz que quando se ama até os defeitos são fofinhos, quando se odeia até a respiração do outro irrita.
O Ministério Público e o juíz Carlos Alexandre decidiram oferecer um palco mediático a Mário Machado, ao racismo puro e duro, acompanham-no, dão-lhe uma mãozinha, dão-lhe um braço, tudo o que o menino precisa para cantar vitória. É o Mamadou Ba e todo o movimento antirracista que são assim pressionados para “ter tento na língua”, para “entrar na linha” enquanto o menino da casa pode destilar ódio o tempo todo sem consequências.
O mesmo privilégio de que um André Ventura beneficia e vários outros.
A grotesca equivalência do antirracismo com o racismo é mais do que a normalização, relativização ou que a vontade de não enfrentar o problema, é racismo tout court.
Solidariedade total com o Mamadou Ba! “É o amor que nos move”, como ele tão bem o diz. Nô Pintcha. Nu sta djunto!
Luísa Semedo
professora