Nuno Teles

Mamadou Ba tem sido um dos principais rostos da luta anti-racista em Portugal. A forma como conseguiu trazer a luta anti-racista para o espaço público é um exemplo do melhor activismo feito em Portugal. Este activismo revela-se crucial no actual momento histórico em que assistimos à ressurgência da direita fascista nas ruas, nos media e no Parlamento. É, pois, gravíssimo que neste momento se assista ao assédio jurídico a Mamadou, numa tentativa de condicionamento do seu activismo por parte do Estado português. Assim, a nossa solidariedade colectiva não é só crucial para a defesa de Mamadou, mas uma necessidade para a luta anti-fascista em Portugal.

Nuno Teles   
Economista e Professor Universitário na Universidade Federal da Bahia  

 

Miguel Cardina

Mamadou Ba é parte indissociável das lutas pela liberdade e pela justiça social em Portugal. As persistentes marcas de racismo estrutural, ainda manifestas no país, são resultado de uma longa história colonial e da falta de coragem em enfrentá-las e superá-las no presente. Nesse trabalho, a voz de Mamadu é imprescindível. Qualquer tentativa para a calar, intimidar ou perseguir é um ataque ao movimento antirracista. E é também um ataque à ampla, histórica e fecunda luta pela igualdade.

Miguel Cardina   
historiador, investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra

 

Maria João Berhan da Costa

Já não se trata apenas de apoiar o Mamadou Ba, o que faria sem pensar duas vezes, tanta é a certeza da falta que ele faz a todos nós que queremos um mundo justo e igualitário.

Agora trata-se, ainda mais, de repudiar o modo como “a justiça” se posiciona em relação a um facínora, fascista assumido, mostrando claramente quem o estado, afinal, representa e defende.

Uma coisa assim merece uma reacção clara. Espero que a consigamos organizar colectivamente. Massivamente e enquanto é tempo.

Maria João Berhan da Costa   
aposentada e activista pelo direito a habitação  

 

José Viana

1. O fascismo mata.

O fascismo não mataria se os fascistas não fossem assassinos.

O fascismo exalta e pratica o extermínio daqueles que considera inferiores: os pretos, os comunas, os paneleiros, as fufas, a ciganada. Os fascistas não seriam assassinos se não fossem fascistas.

Mesmo que se pudesse dizer que nem todos os fascistas são assassinos de facto – consideremos a diferença entre o conceber e o praticar –, aquele a quem o sistema judicial português reconhece o direito de processar Mamadou Ba, é mesmo o que parece e parece mesmo aquilo que é.

Chamemos os bois pelos nomes. O que é que se chama a um fascista praticante, orgulhoso de o ser, condenado por vários crimes que decorrem da coerência entre a sua filiação ideológica e a sua prática concreta, que esteve comprovadamente envolvido em pelo menos um assassinato? Por que outra palavra se pode nomear um assassino?

O fascismo mata. Não mataria se fosse outra coisa. Mas é mesmo aquilo que é.


2. Mamadou Ba é um militante antirracista.

O antirracismo incomoda muita gente no país dos brancos costumes. E ainda bem.

O Mamadou podia deixar de incomodar, ou pelo menos podia incomodar um bocadinho menos. Mas para isso tinha de olhar para o lado. Tinha de fingir que não via o que entra pelos olhos dentro. Tinha de deixar de ser um antirracista. Ou pelo menos deixar de o ser da forma militante, empenhada, comprometida, inteira como o é. Tinha de deixar de ser quem é.

E devemos-lhe tanto, mas tanto, por ser quem é, o que é e como é, que já era tempo de percebermos que se alguém tem de mudar alguma coisa não é ele. Pela minha parte, só lhe posso agradecer a coragem que empresta à luta por um mundo melhor. Não se pode derrotar o racismo e o fascismo se não tivermos a coragem, para começar, de nomear aquilo que combatemos. Obrigado, Mamadou, por chamares os bois pelos nomes.

O antirracismo incomoda. Não incomodaria se fosse outra coisa. Ainda bem que é mesmo aquilo que é.

«O assassino esse seguirá dia após dia

a insultar o amargo coração da vida,

no tribunal insinuará que respondera apenas

a uma agressão (moral) com outra agressão,

como se alguém ignorasse, excepto claro

os meritíssimos juízes, que as putas desta espécie

confundem moral com o próprio cu.»

in Eugénio de Andrade, Requiem para Pier Paolo Pasolini, 1977.

José Viana   
professor  

 

João Manuel de Oliveira

Portugal precisa estar grato a Mamadou Ba. Eu, sem dúvidas, estou. O seu trabalho incansável e corajoso, denunciando o racismo estrutural em Portugal e as desigualdades étnico-raciais leva-me antes a imaginar que o Estado o deveria condecorar. Mas, na realidade, a omnipresença do racismo de Estado levou a uma decisão judicial de o levar a julgamento num processo ínvio. É uma forma de branqueamento de uma luta de décadas que Mamadou, nos coletivos em que está e esteve envolvido, sempre faz bravamente. Partilho a minha perplexidade, pelo racismo de Estado de que está a ser vítima, fundado na razão colonial: somos um dos países com um império colonial mais longo da história, envolvido na expropriação de terras e territórios, corpos e recursos que nunca nos pertenceram. O país que forneceu, isto é, raptou, violentou e traficou milhões de seres humanos levados para as economias de plantação, corpos negros e indígenas nas mãos da violência genocida e colonial portuguesa. A gramática política desse império foi o racismo e Portugal ainda não foi capaz de se pensar para além desse racismo que nos estrutura. Só que explicação não é justificação para o que é injustificável. Como pode o  anti-racismo ser tratado como simétrico do racismo? O racismo não é uma opinião, não é uma atitude, é uma relação social que destrói a possibilidade da pessoa racializada ser tratada democraticamente. E é exatamente isso que esta decisão faz a Mamadou Ba. É deplorável.

Toda a minha solidariedade ao Mamadou Ba, intelectual e ativista, a quem o Estado Português violenta desta forma inqualificável, num país que nem coleta os dados da população estruturados por pertença étnico-racial, que quotidianamente não intervem em atos de racismo perpetrados contra as populações afro-descendente e romani e que gosta de se imaginar não-racista. Não-racista não existe, não é uma posição possível. A normalização do fascismo e do racismo são inaceitáveis. O país devia agradecer ao Mamadou Ba, por trazer para a discussão pública, a forma como a democracia não é democracia inteira se não for anti-racista e não se comprometer com a erradicação do racismo. Estamos com ele.

João Manuel de Oliveira   
investigador e professor universitário, ISCTE-IUL  

 

Helena Pinto

Ouve-se uma vez e pensamos que ouvimos mal, ouvimos uma segunda e custa a acreditar, ouvimos uma terceira vez e fica-se indignada, no mínimo. Mário Machado, cujo curriculum não necessito de aqui relembrar, apresentou uma queixa-crime contra Mamadou Ba, até aqui nada de novo. O que vem a seguir é que é digno de registo: o facto de um juiz (Carlos Alexandre) considerar que existe motivo para levar a julgamento Mamadou Ba por “difamação e calúnia”. Mamadou Ba denuncia o ódio racista que tem levado a inúmeras agressões, entre as quais aquela que levou à morte de Alcindo Monteiro. A Justiça não pode ser palco para quem proclama o ódio. E embora “cega” não se pode deixar levar…

Solidária com Mamadou Ba

Helena Pinto   
animadora social  

 

Domingos da Cruz

Quando aqueles que lutam a favor da dignidade humana, ainda são perseguidos por criminosos que encontram espaço nas instituições do Estado, estamos perante a decadência do Estado. Esperamos que Mamadou seja protegido pelas instituições, para que estas ainda tenham razão para existir!

Domingos da Cruz   
Pesquisador