Hugo Gouveia

Carta ao Paladino da Liberdade

A Voz da Insubmissão desafia a Apologia do Ódio

O nosso Mamadou Ba é um cidadão português e um cidadão senegalês, não só de pleno direito como com toda a legitimidade moral, um facto que transcende o mero plano legal.

Ter a pretensão de retirar a cidadania portuguesa ou de cortar a Palavra ao nosso compatriota Mamadou Ba, resulta de um artifício jurídico, uma artimanha que se seve das lacunas do Direito e compactua com o racismo sistémico e institucionalizado outorgando plausibilidade a uma queixa que pretende inverter o papel de seviciador e escamotear a intenção perversa e malévola de uma ignóbil vitimização que procura, com ardil e maquiavelismo, desvalorizar a Nobreza e o Imperativo máximo da Luta Anti-racista e Contra-racista. O algoz da diferença cultural encontra-se na esteira de um subterfúgio imoral para tentar ludibriar de forma acintosa qualquer sentimento de justiça, num esforço de torturador que usa e manipula a lei para servir o seu interesse de supremacista branco e, em simultâneo, procurar travar desesperadamente o avanço inexorável do irreversível Combate do Mamadou e todas e todos os anti-racistas por um Portugal onde o racismo deixe de ser uma realidade escamoteada, persistentemente dissimulada e se avance finalmente para um País com o necessário desenvolvimento moral, para que não mais tenha vergonha do seu potencial multicultural e aceite e assuma a ignomínia do Passado Colonial.

A nossa Nação é composta por Autóctones e por uma população Imigrante em crescimento saudável e indispensável para o nosso equilíbrio fundamentalmente social mas, obviamente, também económico. Outro amplo segmento da população, frequentemente esquecido no debate político, é constituído pelos Afro-descendentes, que têm sido recorrentemente invisibilizados nas apertadas e exíguas malhas da Justiça. Por este motivo primordial não podem continuar incólumes os crimes de ódio e racistas e é neste ponto nevrálgico que Mamadou Ba tem sido o Rosto não invisibilizável desta luta titânica contra o Leviatã que propaga os seus tentáculos através de infiltrações no designado Estado de Direito, que permitem e viabilizam ao racismo o seu livre curso e não só não é reconhecido como uma Patologia Nacional_ com um Passado de Etnocídio, Escravatura e Colonialismo_ como não é punido pela Lei que consente e permite que um verdugo seja promovido a Vítima.

As leis podem estar susceptíveis ou submetidas ao relativismo cultural, ao contexto social ou ao período histórico, contudo, a Integridade da posição e determinação indómitas na Luta Anti-racista do Mamadou Ba; a probidade da sua Causa indispensável e cujo pleito está na contra-corrente directa da hipocrisia do Imaginário de fantasia perniciosa contida no chavão “Portugal não é racista”_ falácia da qual comungam os fascistas, os lusotropicalistas e os não anti-racistas; a par do sacrifício individual pelo bem-comum e por um Portugal rico pela sua heterogeneidade migratória, demográfica, social e cultural, que se consiga emancipar do seu Racismo estrutural,_ são os  três pontos cardeais de um combate incessante que não é susceptível a qualquer modalidade de Relativismo moral.

O Mamadou Ba é o guerreiro que a sociedade actual exige para alertar, actuar e intervir política e civicamente sobre a Panóplia de violências que sofre a População Negra, está precisamente na linha da frente a alertar, denunciar e exclamar o que poucos querem escutar. Sem qualquer menosprezo por todas e todos que se juntam nas fileiras desta luta absolutamente desigual e quase sempre injusta, o nosso Mamadou é a referência e o arquétipo deste confronto imprescindível marcado por um desequilíbrio das forças em contenda, confronto esse que emana dos avatares de um Poder estabelecido e instalado que procura subjugar, anular e silenciar o Sujeito Político Negro ou simplesmente torná-lo espúrio e inócuo.

No seu activismo o nosso Mamadou Ba não se preocupa com melindres e hipocrisias, nem muito menos em preservar essa Imagem de Ídolo com pés de barro_ com uma assembleia considerável de fiéis_ que consiste num Portugal imaginado como pautado pela tolerância e como isento de discriminação ou não-racista. Pelo contrário, Mamadou Ba, tal como no exutório postulado por Flaubert, toca na ferida para se esforçar em encontrar a melhor cura para a Doença_ e é, de facto, de uma Doença que se trata nesse Portugal mais atávico do qual irradiam: pseudo-narrativas, não obstante serem estruturantes do imaginário racista; uma História que não se pode negar o facto de estar também pejada e impregnada de atrocidades, injustiças, exploração e opressão das colónias no Continente Africano; e, em derradeira instância, uma Memória repleta de uma inevitável subjectividade e afectividade com a Nostalgia por pressupostas glórias passadas, contudo, também eivada de falsidade e não raras vezes ferida de iniquidades.

Não me atrevo a alinhar ou pactuar por acção ou omissão com as diatribes fáceis e imoderadas à postura de confronto com a mentalidade dominante por parte do nosso Mamadou Ba, como muitos adversários políticos e inimigos figadais que se congregam nas críticas ao estilo, vertente da retórica ou modo de argumentação do Mamadou Ba, pelo forte motivo de que defendo a Ideia de que o Discurso e a Palavra articulados de forma exímia pelo nosso Defensor de todas as liberdades, e enquanto profundo conhecedor que também é da nossa Língua-mãe, serão as melhores armas_ o instrumento nesta guerrilha intelectual contra uma Opressão, Subalternização e tentativa mascarada de forçar uma célere Subjugação_ as únicas que, na realidade, têm podido e devem ser usadas sem quaisquer restrições contra os Corcéis da Morte e os Arautos do Ódio.

Tal como todo o Herói digno desse título e merecedor de uma plêiade de honrarias não atribuídas, o nosso Mamadou Ba, assaz e previsivelmente incompreendido pelas vestais do conservadorismo, possui de forma inevitável o dom, a capacidade, o talento, a inteligência e a sagacidade de conseguir perturbar o sonambulismo crónico das consciências. Sem embargo, o redutor maniqueísmo de uma legião de indignados que tem como figura de proa o seu obstinado opositor, o mesmo que consegue ser, de igual modo, o seu fiel antagonista e a sua irrevogável Nemésis, numa figura sinistra e laudatória da Morte: o hammerskin Mário Machado.

Ao passo que o nosso Mamadou Ba luta por uma existência digna, onde impere a emancipação de todas as metamorfoses da Opressão, para todas as cidadãs e todos os cidadãos portugueses que compõem a Nação Portuguesa, uma Comunidade cujo Imaginário tem toda a urgência em ser humanizado com a gravitação para um Ideal que se una na Diferença, na Diversidade, na Heterogeneidade, com o objectivo de contrariar, em todos os os quadrantes da nossa Cultura e da nossa Sociedade, as ambições desmesuradas de uma Hegemonia de Casta e a Ilusão vertiginosa de uma construção deletéria de Portugal como um País fossilizado no conceito homogéneo de “Homem Branco”, com todas as implicações e consequências negativas e destrutivas para a harmonia das múltiplas camadas e estratos da População.

É nesse conceito de “Homem Branco”, possuidor de uma dimensão fulcral para a qual o Mamadou Ba tanto nos tem alertado_ e, por conseguinte, não é de surpreender nem admirar a tenaz resistência, a feroz oposição, a deflagrada cólera, o incandescente ódio e postiça indignação que suscitam o seu discurso centrado no desmascarar permanente das miríades de mentiras destinadas a perpetuar e camuflar o racismo endémico e pandémico, sistémico, ritualizado e recalcado, inconfessado e negado mesmo perante a mais corroborada das evidências como a morte de inocentes.

«A Nação Portuguesa é MultiRacial»_ talvez desta forma, e recorrendo a uma linguagem mais familiar aos que se opõem ao Clarão da sinceridade e honestidade com que o discurso do Mamadou Ba dissipa as trevas do Racismo ora empedernido, ora envergonhado_ a Ideia de um País Multicultural assusta as mentes fóbicas face à Diferença, com os seus delírios endogâmicos que buscam fervorosamente o semelhante e rejeitam ou repelem o estrangeiro ou o sujeito negro, para concretizar um desejo tenaz pelo Homogéneo e, em simultâneo, rejeitam e expulsam, ou procuram expulsar, das suas sociabilidades, suprimindo um encontro vital com o Diverso que, no seu subconsciente poderia pôr em causa ou fazer derrocar a sua Identidade, concebida nas mentes tacanhas como um Monólito, fortificada num Bunker simbólico sobrelotado por medos irracionais e pânicos morais.

Esta concepção de Portugal como “Nação Multiracial”, tem de nos conduzir mais além do principal motor do Racismo que subsiste e persiste em Portugal: o Lusotropicalismo. Este último, não só tem antecedentes na Sociologia de Gilberto Freyre_ com a sua versão do negro como análogo ao Tio Tomás, nos antípodas dos correctos ensinamentos do professor de Freyre que foi Franz Boas_ ou seja asséptico e que nunca se revolta com a sua condição, e na respectiva adopção insidiosa pelo Colonialismo à moda do Fascismo Português,  como é responsável por narrativas que vão procurando minar o discurso Anti-racista que o nosso Mamadou Ba profere e escreve com base numa reflexão profunda e avisada sobre as Patologias Sociais da Cultura arreigada e do Comportamento maioritário no nosso País.

A propalada “tendência para nos misturarmos”_ seria positivo se correspondesse a uma efectiva mixofilia e não ao que acontece na realidade que é grassar uma renitente xenofobia, ainda que por vezes fique ocultado por um pudor ou vergonha de assumir a postura racista abertamente. Contudo, este lema propagandeado pelo doutrina ou ideologia do Lusotropicalismo durante o apogeu do colonialismo, não desapareceu do quadro mental, social e político de Portugal, ao invés embasa toda a argumentação dos que nos querem fazer acreditar na Quimera do “Portugal não é racista”.

No entanto, se, de facto, “Portugal não é racista”, conforme se arvora por todo ou quase todo o espectro político, coloco a interrogação sobre o motivo pelo qual assusta tanto às pessoas engajadas em desmentir a existência do Racismo e se mostram tão ofendidas com o impacto das Verdades enunciadas por Mamadou Ba. Será porque desperta os Terrores mais Imemoriais ou aguilhoa e atormenta com grande intensidade uma certa Consciência Branca Colectiva?

Parece, ou fica subentendido que um Sujeito, Livre e Autónomo, Negro e com dupla nacionalidade, que se recusa a estagnar na subserviência, na subalternização e na invisibilidade e ainda, para cúmulo dos que lhe são hostis, possui a Inteligência, a Experiência e o Conhecimento para refutar e derrotar qualquer tentativa de encontrar uma justificação, defesa ou desculpabilização do nosso País que continua a recusar categoricamente assumir uma plena responsabilização por todas as consequências destrutivas do Racismo em todas as suas variantes, disfarces e mutações. Estas qualidades provocam uma onda generalizada de indignação que consegue unir neoconservadores, conservadores, neo-nazis e, pasme-se, alguns progressistas também. Porque o Mamadou Ba não permite nem consente que a Verdade fique refém das convenções sociais ou da desresponsabilização nacional pelo flagelo do Racismo. Destarte, o Mamadou Ba não se refugia em verdades confortáveis ou lisonjeiras.

A concepção da Nação Portuguesa tem que estar em relação ou contacto com o facto insofismável de que se desdobra numa população que é “Multiracial” ou Multicultural e Multiétnica, conforme se optar pela designação, contanto que este muito saudável e desejável axioma suscite anti-corpos e repulsa, revolta e perturbação em todas as mentes fechadas que se recusam a reflectir sobre o Racismo no nosso País e não só.

Identificar, nomear e lutar com o Racismo em Portugal não é contribuir para um problema, mas são, ao invés, as etapas sem atalhos para a muito necessária responsabilização colectiva e o prelúdio de uma consciencialização a nível nacional para que o racismo seja considerado uma Patologia Social e um Crime em Portugal, sem que a população branca queira acordar do pesadelo porque se pretende manter agarrada ao seu Privilégio e no conforto do seu lugar fixo na Hierarquia que oprime a População negra.

As intervenções do Mamadou Ba serão quase sempre inevitavelmente contundentes para os que possuem uma consciência pesada apesar de recusarem peremptória e inflexivelmente o seu fardo moral. Os negacionistas dos malefícios, opróbrios, sofrimento atroz e prejuízos evidentes e múltiplos do Colonialismo perseguem, no avesso da Ética, a forma de encontrar mecanismos psicológicos de defesa para uma retórica nacionalista na pior acepção do termo, ou seja, fascista ou extremista, enveredando por um labirinto de falsificações dos factos históricos e incorrendo numa Projecção ao atribuírem ao Mamadou Ba a sua própria visão deturpada de um Passado criminoso todavia idealizado e romantizado pelo Fascismo.

O idílio dos que acusam, qual prosélitos da indignidade, o Mamadou Ba de pretender “reescrever a História”, são os primeiros a ajustar e a moldar os acontecimentos e factos às suas convicções pessoais e a uma visão do mundo que presta tributo à Dominação, Usurpação, Devastação, Exploração, Opressão e Desumanização das várias gerações da População Negra em África e no Território Nacional.

Até, inclusivamente, eminentes historiadores verberam o argumento paralogístico de que “não se pode julgar o passado à luz do presente”, como se o Colonialismo fosse intocável ou uma relíquia nacional e não, como efectivamente foi, uma engenharia social letal e infernal, encarando de forma redutora o Colonialismo como se este fosse um simples e despojado epifenómeno, perdido e dissipado na qualidade de acidente ou erro esporádico da História, quando não apregoam que oferecemos a Civilização às populações negras nos países colonizados em África. Em suma, um pretexto para evitar a condenação das atrocidades cometidas por um sistema político e económico que pretendeu violentar todo o tecido social das populações negras nas colónias.

Nesta caminhada desigual e hierarquizante, cria-se um espaço de discussão para a logorreia da extrema-direita e cria-se, também, o monstro da redução da realidade histórica a uma ideologia mortífera que se repercute no Racismo ou nas suas ramificações mais ou menos escamoteadas. Este fenómeno procede da conversão da Nostalgia por uma Nação Imaginada no cadinho onde as esperanças por uma sociedade mais igualitária e solidária são goradas e as expectativas legítimas da população negra necessitam de um combate Anti-racista permanente face  às vertigens fóbicas dos cientistas que se “incomodam” com a relevância do ponto de vista da População Negra outrora colonizada e que, na actualidade, padece com a Patologia Social do Racismo e sua subsequente desagregação cultural, na medida em que esses mesmos cientistas pretendem que à sua semelhança todas e todos se deixem entregar e render à ideologia do Passado Colonial.

Por consequência, são inúmeros os obstáculos à emancipação da sobrecarga do Passado Colonial no antigo Portugal Imperial que prossegue com o seu saudosismo da Época Dourada que só o foi para os brancos a abarrotar de privilégios em detrimento das condições de vida das populações negras.

Numa mistura explosiva de Exotização, Paternalismo e Branquitude, o Legado Colonial é negado quando as suas consequências são irrefragáveis e criminosas ou então é reivindicado quando grassa a Megalomania da “Epopeia do Povo Eleito” ou das façanhas e conquistas das chamadas “Descobertas” que culminaram em Genocídio e Espoliação das Populações Indígenas ou Africanas escravizadas, retirando-lhes a Humanidade e suprimindo ou eliminando a sua Dignidade. Confundem História com o seu Manifesto Pessoal e Agenda Política Privada, embora disfarçada de suposta imparcialidade, conquanto seja essa a acusação mais indolente e insolente de que culpam o Mamadou Ba, mais uma vez é de pura Projecção que se trata.

Com o objectivo de se isentar de qualquer laivo ou sentimento de culpa ou qualquer tipo de responsabilidade pelo ominoso Legado Colonial, tentam guetizar o Pensamento Livre e a Reflexão Crítica do Mamadou Ba ou então limitam-se a circunscrever a luta Anti-racista a um conjunto de estereótipos e subconjunto de lugares-comuns que visam isolar e enfraquecer o Poder da Palavra do Mamadou Ba que consegue fazer-se escutar em todo o espectro político.

Porém, não é sempre uma evidência o campo político que opta por se precaver através do combate Anti-racista contra o principal flagelo da sociedade portuguesa a par da Homofobia, da Transfobia e do Capacitismo. Tendo em conta a especificidade de cada um destes combates vitais, o combate ao Racismo será, contudo, a primeira etapa a transpor na senda de uma sociedade portuguesa mais justa, igualitária e solidária.

Os obstáculos à luta Anti-racista não emanam em exclusivo da Direita nem da Extrema-Direita, a forma como a Esquerda é defensiva ou cuidadosa em excesso com a questão do Racismo em Portugal_vede o caso da estátua do Padre António Vieira e suas mensagens subliminares da inaceitável representação dos Índios como crianças submissas e numa postura de reverência face ao Homem Branco, sem pôr em causa as qualidades literárias do sacerdote mas realçando e destacando o colonialismo descarado do enquadramento que foi esculpido_ concentrando-se noutras lutas paralelas que, independentemente da sua relevância, não podem ser levadas a cabo na sua forma mais eficaz varrendo o Racismo para debaixo do tapete ou evitando o derrubar e desmontar o Racismo Estrutural em Portugal. Não pode haver indefinição, hesitação ou ambiguidade em relação à luta Anti-racista, posto que esta é a principal causa que separa a Esquerda de cariz revolucionário da Extrema-Direita e da respectiva Direita mais asseptizada que, não obstante, está subjugada e refém da segunda. Assim como a Esquerda inibida ou de socialismo teórico ou reformista.

Os partidos indecisos ou reticentes acabam por involuntariamente participar de forma activa no flagelo do Racismo, não conseguindo impedir a Hostilidade à Diferença Cultural; o abominar da Diversidade Social; padecendo do complexo psicológico e ético dos pânicos morais face aos fluxos migratórios; apavorando-se com a assombração na sua psique do medo face ao Estrangeiro e, em última instância, o cultivar de emoções negativas e nocivas que provocam e nutrem o Ódio social e moral dando lastro pleno à Xenofobia irmanada com o Racismo.

O hammerskin Mário Machado, deste modo, acaba por não surpreender na sua arrogância, insídia, perfídia e manipulação, porquanto joga com os paradoxos do Sistema Judicial e uma vez que aprendeu na sua reclusão os meandros mínimos do Direito. Sem perder muito tempo e energia com o aspirante a Tirano, é óbvio que este tem por hábito ameaçar, agredir e retirar-se, ostentando a sua astúcia e habilidade para defender e unfanar-se a prática de Violência Orgíaca legitimada por Rituais de Sangue que são apanágio de grupelhos da Extrema-Direita. Por este motivo, procura com a sua queixa absurda e digna de um vilão inventado por Ionesco ou Beckett, pressionar o Tribunal ao mesmo tempo que encarna um papel que em nada se coaduna com a persona que divulga nas redes sociais e com o seu estatuto de transgressor violento, optando pelo jogo mais subtil da aparência de respeitabilidade e dissimulando as suas intenções  que já tinha publicitado amplamente em fases menos compostas da suas investidas. Como quando foi filmado de caçadeira na mão pela televisão pública a perorar que os conflitos deviam ser resolvidos na rua.

É difícil compreender e ainda menos aceitar que haja consistência mínima na queixa de alguém cujo instrumento favorito de comunicação é especular e provocar emoções primárias nas pessoas, insultar e ameaçar investindo toda a sua energia explícita ou subliminar a apologia do Ódio racial e social.

A questão do racismo em Portugal é acompanhada intimamente pelo que se convencionou designar como Colonialismo Invertido que consiste sobretudo na Fantasia Neocolonial de uma Guerra Civil na qual os colonizados e seus descendentes reclamariam pela violência o ressarcimento dos seus direitos. Trata-se de um Nocturno Receio bem como de um inconfessado e ambivalente anseio de uma maioria que se reclama Nacionalista ou afirma defender os interesses do País e, todavia, mesmo que não sejam convictos racistas são seus cúmplices por omissão na Luta declarada e abertamente Anti-racista que é o nosso imperativo social.

Se for feita a necessária reflexão crítica sobre esse dado fundamental facilmente se pode verificar que a queixa do hammerskin Mário Machado é, antes de mais, um sintoma ou uma síndrome da Impotência de alguns protagonistas políticos em implementarem, defenderem e organizarem da forma mais eficaz a Luta Anti-racista. Para este efeito importa_sobretudo muito mais do que o enfoque ou dar demasiado palco à encenação de um neo-nazi assumido_, apoiar e conseguir o maior raio de alcance para o combate político, na batalha pela Memória, na Desconstrução das Grandes Narrativas que apresentam ou concebem Portugal como um País de “Descobridores” e “Conquistadores”, parecendo ignorar as consequências da Escravatura, o Genocídio e o Colonialismo; e a importância fundamental de uma História cuja pedagogia possa contribuir para mudar e alterar de forma profunda e significativa as Mentalidades, independentemente da Geração a que se pertença.

Falta falar na Ideia ou Ideologia subjacente e propagandeada para tentar desvalorizar a relevância inquestionável do combate do Mamadou Ba, uma armadilha que permite que o hammerskin Mário Machado consiga mobilizar as autoridades judiciais para procurar demover o nosso Mamadou Ba, atrasando e colocando com essas manobras de diversão, o avanço inexorável da Luta Anti-racista. É nessa Luta a que o Mamadou Ba consegue alertar Portugal para que se desenvolva não apenas no plano económico, mas sobretudo no plano da consciência colectiva e do desenvolvimento moral, posto que indubitavelmente urge transformar ou sensibilizar as consciências para mobilizar as pessoas que tenham a mente suficientemente aberta para que compreendam finalmente que arrancar o Racismo do tecido social não corresponde a atacar a Pátria, tal como arvoram e distorcem os falsos nacionalistas que tentam impor a sua doxa como Vontade Colectiva.

Por conseguinte, a transmissão, inoculação e contaminação através dos estereótipos sobre a Luta Anti-Racista do nosso Mamadou Ba elegem-nos sistematicamente como uma espécie de Rebelde inconsequente e incongruente nas suas causas ou forçam a sua caricatura como Agitador incendiário quando o seu Discurso é incisivo e destapa os covis da Extrema-Direita e seus apaniguados de forma urgente e necessária. Por vezes, assiste-se ao mesmo comprimento de onda nas invectivas e caricaturas às intervenções do Mamadou Ba, tanto à Esquerda como à Direita, o que faz imediatamente recordar aqueles, intelectuais incluídos, que vêem ainda o pensamento e a crítica de Frantz Fanon qualificando e adjectivando a sua Anatomia do Racismo e do Colonialismo no Ocidente como uma mera defesa do Terrorismo.

«O Negro, mesmo sincero, é escravo do passado.

Contudo, sou um Homem, e nesse sentido a Guerra do Peloponeso

é tão minha como a descoberta da Bússola.

Perante o Branco, o Negro tem um passado a valorizar,

uma desforra a tirar; perante o Negro, o Branco contemporâneo

sente a necessidade de se lembrar do período antropofágico. […]

O problema tratado aqui situa-se na temporalidade.

Serão desalienados os Pretos e os Brancos

que se tiverem recusado a deixar-se encerrar na

Torre substancializada do Passado. Para muitos outros Pretos

a desalienação nascerá, por outro lado,

da recusa de considerar a actualidade como definitiva.

Sou um homem, e é todo o passado do mundo

que tenho de reassumir. Não sou responsável

pela revolta de São Domingos.

Cada vez que um homem fez triunfar a

dignidade do espírito, cada vez que um Homem disse não a uma

tentativa de sujeição do seu semelhante,

senti-me solidário com o seu acto.

De forma alguma devo tirar o passado dos povos

de cor a minha vocação original.

De forma alguma devo dedicar-me a fazer reviver uma Civilização Preta

injustamente desconhecida.

Não me faço o Homem de Nenhum Passado.

Não quero cantar o passado à custa do meu Presente e do meu Futuro.

Não foi por ter descoberto uma cultura própria que o Indochinês se revoltou.

Foi muito simplesmente

porque se tornava, a mais de um título, impossível respirar.»

Frantz Fanon, Pele Negra, Máscaras Brancas, Paisagem, 1975: 235-236.

Porque o Mamadou Ba Luta por um Portugal que poucos sonseguem conceber ou imaginar_ o Portugal com Futuro que não soçobre num Nacionalismo Fascista ou na Fantasia Racista supostamente mais suave do Lusotropicalismo com uma “Identidade Nacional Multiracial”_ este conceito traduz-se num embuste que tem servido de alibi ao Racismo negado em Portugal, com o respectivo branqueamento do Passado Histórico sem atender à destrutividade da Expansão portuguesa que começou no Etnocídio e culminou numa Guerra Colonial. O mérito de Portugal como Nação também deriva do Orgulho mais saudável nos seus fluxos migratórios e tem como pedra angular da sua prosperidade a Virtude de ser um País com a capacidade e predisposição para acolher cidadãos de várias nacionalidades e diferentes origens étnicas.

Mamadou Ba com a sua persistência e resistência aos ataques mais ou menos ferozes dos que se recusam a aceitar as evidências históricas, dá-nos a esperança de um Portugal edificado sobre os alicerces da Diversidade Étnica, Social e Cultural, liberto dos Atavismos Assassinos e das Fobias à Diferença, pleiteando por uma não tolerância da Racista.

Temos, por isso, de declinar a índole Racista e as atitudes Xenófobas, prescindindo ou tornando necessária a pedagogia essencial que consistirá em libertarmo-nos catarticamente do Desejo negado e renegado por uma Distopia de Endogamia Social, com correspondência directa a um Estado de Entropia Colectiva que qualquer sociedade europeia ou mundial deverá evitar caso aspire a manter a estabilidade da higiene mental da sua População.

Ao desmontarmos peça por peça os malabarismos retóricos e eufemismos deletérios dos Nacionalismos Fascistas resistentes em último grau ao inevitável Progresso Social do Multiculturalismo, por muitas alergias mentais que a palavra e o conceito despertem, por certo iremos encontrar as Verdades, os Esclarecimentos e os Discernimentos das Ideias Inovadoras do Mamadou Ba que rompem e quebram os muros erguidos contra a Liberdade. A alternativa a esse processo de autonomização perante as violências estruturais e simbólicas, é permanecer no Medo e na Arrogância, dependentes de Âncoras que correm o risco de agrilhoar a nossa Consciência Colectiva no lodo do Fascismo que arrastaria o nosso País no Pesadelo Racista com a perpetuação da degradação e desumanização dos nossos conterrâneos, simplesmente por terem uma origem étnica diferente, ou uma epiderme menos clara ou então por pertencerem a culturas estranhas à cartilha conservadora e à narrativa da Fantasia mórbida do “Portugal só para os portugueses de gema”, ignorando e desprezando o Legado das Cultura.

Não queremos um Portugal fechado, autárcico, hermético e blindado à Riqueza da Heterogeneidade Social e Cultural.

Que as Hárpias do Averno Fascista nunca logrem cercear o voo das asas ao Pensamento Indómito  e à Liberdade sem Peias que o Mamadou Ba sabe defender como ninguém.

Ao Espírito Guerreiro do nosso Mamadou Ba, declaro que não se pode expulsar ou silenciar um Patriota Genuíno, aquele precisamente que não se sente ameaçado por culturas e pessoas marcadas pela diferença e que não precisa de encontrar as suas poucas forças no ataque sistemático e respectiva diabolização da População Imigrante, o grande bode expiatório da Extrema-Direita a par da população Roma e dos Afro-descendentes, como se compenentra a fazer numa interminável sanha ditada pela covardia do Fascismo. Mamadou Ba não se agarra ao passado disposto a sacrificar gerações em nome de um Ideal de uma Histoire Evenementielle ou dos Homens com “H” maiúsculo, esse Eterno Retorno do retrógrado Fascismo, tudo para benefício de castas eugénicas e de uma visão inadmissível no Presente da “Nação como Una e Indivisível” em detrimento do contributo das populações migrantes, refugiados, os Afro-descendentes e o povo Roma. Pensemos  antes, como o Mamadou Ba na importância de eliminar o Racismo para aumentar a conjugação de forças que só o encontro com culturas diferentes e diferentes origens étnicas permite na solidariedade com o Diverso que um “Nós” sem dicotomias insanáveis com os “Outros” poderá viabilizar.

Quem ataca o Mamadou Ba de forma explícita ou implícita ataca também um Portugal com Futuro que não se perde na Nostalgia por uma Perfeição que nunca existiu, a não ser na mente dos Fascistas que defendem glórias efémeras como se fossem eternas ou não fossem crimes contra a humanidade como o extermínio dos Indígenas, a desumanização extrema da escravatura e da exponencial degradação, opressão e exploração inerente a todas as formas de Colonialismo.

Sem dúvida que a Economia está na base da maioria das desigualdades e assimetrias sociais, contudo, “Não se deve começar uma casa pelo telhado”, como refere o adágio popular o que implica que a base de uma Nação Portuguesa realmente saudável e próspera tem de estar apoiado no alicerce de uma sociedade na qual o racismo seja combatido em todos os vértices da pirâmide hierárquica e em todos os quadrantes políticos, o único caso em que deve haver, de facto, um consenso político porque a transformação da sociedade precisa da dissensão, sem anular a especificidade dos partidos ocorre na união pelo combate e respectivo desarreigar do Racismo em Portugal.

Obrigado mais uma vez Mamadou, do Coração,

Hugo Gouveia
antropólogo