Mamadou Ba não precisa de quem o defenda de ataques racistas e fascistas. Não precisa hoje, nem nunca precisou no passado, porque sempre enfrentou com enorme coragem as perseguições, os insultos, as agressões, os processos e os ataques de certos sectores da extrema-direita e da direita em Portugal. Sempre esteve à altura dessa constante vigilância pidesca sobre a sua atividade política, dessas permanentes provocações, mais ou menos violentas, sobre as quais os muitos comentadores ou mesmo os seus adversários políticos no espectro democrático nunca souberam expressar uma palavra de solidariedade ou de apelo à justiça. Mamadou enfrentou o empolgamento da extrema-direita, respondeu a ataques racistas e xenófobos, manteve um posicionamento crítico sem recuos sobre a violência policial, e fê-lo sempre, junto com seus companheiros e companheiras do ativismo político, com enorme persistência e reiteradamente, sem se furtar aos olhares professorais e aos escrutínios doutrinais de uma certa esfera pública que teimava, e teima ainda, em o “empurrar” para o mesmo saco dos seus agressores. Mamadou tem sido constantemente descrito como uma figura do “extremismo” e do “radicalismo” esquerdista – mesmo como se isso fosse afinal algo de impensável ou potencialmente antidemocrático – e, sobretudo, tem sido acusado de “racismo reverso”- esse conceito perverso, essa hipócrita figurinha ideológica criada para acusar as vítimas de racismo de violência racista por resistirem contra esse mesmo racismo. Mamadou Ba, continua hoje lutando como o faz desde há dezenas de anos, e uma vez mais neste processo judicial que recentemente lhe moveu o Ministério Público, contra o atavismo e cinismo de uma certa opinião pública e de uma certa postura política, aparentemente conciliadora e que reclama uma pacificação da sociedade portuguesa, mas que resulta apenas num apagamento dos conflitos e das feridas (a colonial, em particular), que classifica a evidente escalada da violência racial de mera criminalidade, e, que por isso, reitera os ataques às vítimas do ódio racial e aos que resistem ao racismo, numa réplica contemporânea dos “bons costumes” do Estado-Novo. E é por isso que me junto aos que não podem deixar de agradecer ao Mamadou Ba pela sua abnegação e pela sua entrega à luta e ao combate contra estes preconceitos, discriminações e ódios. Somos nós que precisamos de Mamadou. De muitos mais Mamadou. O que não precisamos é de ódio racial, de discriminações de qualquer tipo e de fascismo.
Paulo Raposo
antropólogo, docente universitário